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Endereço sem Número

A casa velha tem lá seus requintes. Apesar da pintura descascada, dos muros pichados e sujos, e dos canteiros secos e pouco floridos, a arquitetura relembra os casarões paulistanos da década de 1950, com o pé direito alto e janelas grandes de madeira. Do jardim em extinção restam algumas árvores que provém a sombra necessária para a pele ressecada e fininha daqueles que ali moram.

 

Há seis meses a casa de esquina entre as ruas Honduras e José Clemente voltou a ser ocupada. Atualmente, 27 pessoas habitam o espaço de 210 m² no qual todos dormem no chão, com colchões dispostos como em um acampamento. A maior parte dos residentes são idosos. Mas nem sempre foi assim. Desde maio, a rotatividade na ocupação foi grande segundo relatam os próprios moradores.

 

A construção foi dada a Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) em sinal de agradecimento. Maria Aparecida Kerberg a doou como retribuição ao hospital da Universidade aos 91 anos, antes de falecer em decorrência de câncer. Durante sete anos, a partir de 2007, a casa no nobre bairro do Jardim Paulista ficou abandonada, o que traz implicações quanto à infraestrutura até os dias de hoje.

 

O encanamento da casa é velho, assim como a fiação. Não tem campainha nem numeração. O proclamado racionamento proposto pelo Governo para evitar o desperdício obriga o manejo de um sistema de coleta da água da chuva com três galões que ficam expostos ao sol sem maior cuidado. É dessa forma que se lava o quintal e se rega as plantas restantes. Na casa não há chuveiro, e luz elétrica apenas na sala.

 

Este, sem dúvida, é o ambiente mais movimentado da casa. A televisão de tubo passa despercebida enquanto o bate-papo acontece, mas é uma grande companhia nos dias de semana. A divisão de espaço nos três sofás dispostos no cômodo é democrática: cabem quatro pessoas sentadas em cada um. É o espaço de convívio da família – é assim que todos se referem aos compadres, como uma família.

 

No último dia 17 o futuro da família Honduras esteve em pauta. O aposento pacato, que vem abrigando grande número de idosos nos últimos tempos, tornou-se uma sala de reunião da Frente de Luta por Moradia (FLM), movimento que coordena diversas ocupações pela cidade, sobretudo na região central. O assunto da discussão era essencial: um possível suporte da Prefeitura, do tipo bolsa-auxílio, para garantir moradia ao grupo.

 

Além da cessão do espaço e do sustento dos moradores, outra luta dos organizadores da ocupação é pela revitalização da construção. A casa, segundo Érika, uma das administradoras, precisa de reformas para prover condições mínimas de conforto aos moradores.

 

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